QUEM TEM MEDO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ARROJADO? | PARTE I

QUEM TEM MEDO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ARROJADO? | PARTE I

No início dos anos 2000, começou a circular entre os profissionais atuantes na seara tributária a então desconhecida tese da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS que, 14 anos mais tarde, viria a ser considerada a tese do século, quando o então eminente Ministro Marco Aurélio do STF, relator do Recurso Extraordinário 240.785/MG, veio a proferir o primeiro voto da Corte Excelsa favorável à essa tese, inicialmente desprezada por muitos daqueles que se gabam de se autointitular como juízes das teses tributárias, ao eleger aquelas proposições que consideram que  serão vitoriosas, bem como aquelas que serão derrotadas, como se fosse possível ter uma bola de cristal onde se pudesse vislumbrar o resultado das incontáveis teses tributárias antes de seu julgamento final pelo Poder Judiciário.

Evidentemente que esse tipo de postura acaba por trazer incalculáveis prejuízos aos contribuintes que, eventualmente, venham a seguir a recomendação do autointitulado “guru” em matéria tributária, ao julgar para o cliente e contribuinte o destino da tese, tanto na hipótese de vitória, como na hipótese de derrota no judiciário.

Isto porque a depender da forma como a nova tese for aplicada pelo contribuinte, mesmo na hipótese de derrota, pode haver um ganho financeiro. E pode acontecer, a considerar a estratégia utilizada pelo contribuinte, que aquele enunciado vitorioso acabe por ser tornar uma vitória de Pirro, ou seja, o contribuinte ganha a tese no judiciário, mas esse ganho não representará vantagem alguma sob o ponto de vista financeiro, o que haveremos de concordar, frustrará o principal objetivo da empresa que é dar lucro aos seus respectivos sócios.

O que estamos querendo dizer com isso é que, em primeiro lugar, não podemos, em nenhuma hipótese, ser juízes das teses tributárias. Se a enunciação for plausível, tiver um bom arcabouço jurídico como fundamento, não há porque resistir à sua imediata aplicação, deixando a palavra final para o judiciário, que irá decidir, após o contraditório e ampla defesa, se a tese é ou não válida.

E, em segundo lugar, colocar, imediatamente, em prática na empresa, a tese proposta para não apenas evitar a prescrição do direito do contribuinte, mas, principalmente, para garantir o resultado financeiro decorrente da sua pronta aplicação.

Tomando como exemplo a tese da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, podemos facilmente concluir que aqueles contribuintes que abraçaram o tema desde o início dos anos 2000 tiveram um espetacular ganho financeiro, o que não pôde ser aproveitado por aqueles que quiseram ingressar no bonde somente em 2014, ano da primeira decisão do STF favorável à tese, como acima mencionado, ou em 2017, ano em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706/PR, no bojo do Tema 69, decidindo,  em sede de repercussão geral, que o ICMS não pode compor a base de cálculo do PIS e da COFINS.

Dependendo do porte da empresa podemos estar falando em dezenas de milhões ou até mesmo em bilhões de reais, perdidos por conta daqueles que embarcaram no achômetro de “gurus” que se atribuem o duvidoso poder de adivinhar as futuras decisões dos tribunais pátrios.

Não é sem razão que um estudo conduzido pelo ilustre professor Amaury José Rezende, do núcleo de controladoria e contabilidade tributária da FEA/USP de Ribeirão Preto, com 114 das maiores empresas de capital aberto que fizeram ou fazem parte do IBrX 100, índice de desempenho das cotações dos ativos mais representativos do mercado, chegou à importante conclusão segundo a qual “mesmo que o planejamento é autuado e gera litígios administrativos e judiciais a vantagem da empresa é pagar menos tributos. Isso explicaria a prática de planejamentos tributários agressivos pelas companhias, diz Rezende”. (Sucessivos Refis tornam elisão fiscal vantajosa – Valor Econômico de 07/06/2017 – grifos nossos)

Nesse contexto, a tese apresentada pelos eminentes professores, os juristas Paulo de Barros Carvalho e Kiyoshi Harada Harada, por meios de abalizados pareceres, defendendo que os Títulos da Dívida Externa Brasileira, emitidos em libras esterlinas na praça de Londres, não estão prescritos, e podem ser utilizados para compensação de tributos, está sendo considerada como a nova tese do século.

E como dissemos e reafirmamos que  não devemos ser juízes das teses apresentadas, e para evitar cometer o mesmo grave equívoco daqueles que no início dos anos 2000 ignoraram, solenemente, a primeira tese do século, excluindo o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS de suas operações, e deixando de recuperar milhões ou bilhões que poderiam ter se transformado em caixa para a empresa ou lucro para o controlador, e sabedores de que, como demonstrou a pesquisa da USP acima apresentada, no sentido de que as maiores empresas  do Brasil praticam o planejamento tributário arrojado, a resposta é que a nova tese do século não pode e não deve ser ignorada, sob pena de as empresa deixarem passar in albis a segunda maior oportunidade de ganho tributário que se apresenta nos dias atuais, com perda financeira irreparável dos contribuintes.

Newton José de Oliveira Neves